Esquecer o INSS e fazer sua própria previdência? Talvez você se surpreenda
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By Carlos Max
Depois das mudanças radicais para a aposentadoria, propostas pelo governo na reforma da Previdência, você deve ter visto e ouvido muita gente dizer que a solução é parar de pagar o INSS e “sustentar o governo”.
Essas pessoas, revoltadas com as novas regras, propõem que esse dinheiro seja investido por conta própria, para ter uma renda garantida na frente e, quem sabe, poder parar de trabalhar mais cedo. Será que vale a pena? O resultado pode surpreender.
Primeiro, nem todos podem fazer essa opção. Quem trabalha com carteira assinada tem o desconto automático do INSS em seu pagamento.
Mas há um grande número de pessoas que hoje pagam a Previdência de forma voluntária. São trabalhadores informais, autônomos, microempresários, donas de casa, estudantes e até desempregados. O pagamento permite o acesso dessas pessoas a outros benefícios do INSS, como auxílio-doença e salário-maternidade, além da própria aposentadoria.
Esses podem optar por deixar de pagar a contribuição e fazer uma aposentadoria alternativa. Será bom ou ruim?
INSS x investimentos
A pedido do UOL, o consultor Mauro Calil, especialista em investimentos do banco Ourinvest, fez projeções e comparou o INSS com três aplicações:
- Poupança
- Previdência privada
- Tesouro Direto
Foram considerados os mesmos valores de aplicação mensal.
A poupança é o pior deles. A previdência privada é intermediária. O Tesouro Direto é a melhor opção, em certas situações, mas por pouco. A surpresa é a que a aposentadoria do INSS é quase tão boa ou melhor que o Tesouro Direto.
Foram consideradas duas situações básicas:
- Um jovem de 20 anos que nunca contribuiu para a Previdência
- Um adulto de 40 anos que contribuiu por 20 anos
As condições da projeção foram as seguintes:
- Aposentadoria aos 65 anos (é o mínimo exigido pela nova proposta)
- 4 faixas de valor aplicado por mês: R$ 50 (valor de microempresário); R$ 100 (média de autônomo e dona de casa); R$ 500; e R$ 1.040 (teto da Previdência para autônomo)
- Juros considerados para cada aplicação: poupança: 6% ao ano; previdência privada: 8%; Tesouro Direto: 10%
- Inflação média descontada de 4,5% ao ano
- Os valores obtidos são líquidos, já descontado o Imposto de Renda
- Tempo de vida estimado de 85 anos
A primeira surpresa: se um jovem de 20 anos deixar de pagar R$ 50 (valor de microempresário) para o INSS por mês e colocar o dinheiro no Tesouro Direto, ele terá um rendimento, aos 65 anos, de R$ 432 mensais. O INSS pagaria praticamente o dobro disso: R$ 845.
Se aplicar o teto da Previdência para autônomo, de R$ 1.040 por mês, esse jovem vai conseguir R$ 8.981 no Tesouro Direto, uma diferença de mais de R$ 4.000 sobre a aposentadoria paga pelo INSS (R$ 4.875).
Para um adulto com 40 anos, que já pagava o INSS desde os 20 anos e resolvesse só agora fazer aplicações alternativas, seria péssimo negócio largar a previdência oficial. O INSS ganha em todos os casos de investimento mensal. Na aplicação máxima (R$ 1.040), a renda aos 65 anos com INSS seria de R$ 4.875, quase o dobro do resultado com Tesouro Direto (R$ 2.502).
Veja as comparações no quadro abaixo.
Risco de regra mudar de novo
A decisão se complica porque não se sabe como vai ficar a lei no futuro. “Será que daqui a 10 anos a regra não vai mudar de novo e o teto [de aposentadoria] vai cair?”, questiona Mauro Calil.
Ele sugere que o trabalhador monte uma cesta de produtos, como LCI e LCA, títulos do Tesouro Direto e fundos imobiliários, de forma a alcançar uma rentabilidade em torno de 10% ao ano, sem considerar a inflação. “É um plano com retorno garantido, mas que exige certa disciplina”.
Se o investidor não se sente seguro para colocar seus recursos em vários lugares, ele pode concentrar o dinheiro nos papéis de Tesouro Direto com prazo mais longo, afirma Calil. “O Tesouro Direto é uma boa opção. E, com certeza, infinitamente melhor que a poupança. Quem está pensando em juntar dinheiro para se aposentar tem que migrar já da poupança para o Tesouro Direto.”
Cuidado com taxas nos planos de previdência
Planos de previdência podem ser uma opção cômoda para quem tem pouca experiência com investimentos, mas Calil alerta que preciso ficar atento às taxas de administração e carregamento, que podem reduzir muito o rendimento ao longo do tempo.
Se investir por conta própria é um bom negócio para se aposentar, as “pegadinhas” da vida podem estragar os planos no meio do caminho. O planejador financeiro Fernando Meibak, da consultoria Moneyplan, recomenda que o trabalhador continue recolhendo INSS, mesmo voluntariamente, justamente por causa dos imprevistos, como casos de doença, morte ou invalidez.
“O INSS oferece coberturas que são muito importantes nessas situações. Para se ter os mesmos benefícios com uma previdência privada, o valor da contribuição aumenta bastante. E se você tiver feito outro tipo de aplicação, como Tesouro Direto, provavelmente vai ter que sacar o dinheiro antes do que planejava para lidar com a situação.”
Perigo de banco quebrar
O professor Ricardo Teixeira, coordenador do curso de MBA em Gestão Financeira da FGV, alerta para os riscos de se fazer um investimento por um período tão longo, especialmente por quem opta por um fundo de previdência privada.
“Há o risco de o banco quebrar ou de o gestor do fundo aplicar mal o seu dinheiro. Considerando as diversas crises pelas quais o Brasil já atravessou nos últimos 30 ou 50 anos, não é um risco desprezível. Mas também é verdade que o setor de previdência privada hoje é bem fiscalizado, o que reduz a chance disso acontecer”.
Apesar de todos os problemas enfrentados pelo INSS, Teixeira acredita que o governo não deixará a previdência pública quebrar. “O poder de compra da aposentadoria pelo INSS certamente vai diminuir ao longo do tempo. Mas, em última análise, ela é mais segura porque você tem a garantia de pagamento do governo. Olhando por esse lado, da segurança, vale a pena manter a contribuição, mesmo que seja para receber um valor pequeno.”
(Edição: Armando Pereira Filho)
CORREÇÃO: A versão original desta reportagem considerou erradamente a alíquota de 11% como teto de contribuição da Previdência para autônomos. A alíquota correta para obter o teto de aposentadoria (R$ 5.170) é 20%, e não 11%.
Com isso, ficou errada a conclusão sobre jovens de 20 anos que aplicassem o valor máximo (que é R$ 1.040, não R$ 570, como informado originalmente). Na realidade, eles teriam, aos 65 anos, uma renda de R$ 8.981 no Tesouro Direto, que fica sendo a melhor opção disparada.
Para um adulto com 40 anos, a previdência oficial continua sendo vantagem, mas com margem menor sobre o Tesouro Direto. Originalmente, a reportagem informava que o INSS daria um rendimento 3,5 vezes superior. O certo é quase o dobro. O texto e o quadro foram corrigidos.