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sexta-feira, 17 de abril de 2015

Maioridade penal aos 18 anos: um dogma que precisa ser derrubado


 Gabriel Castro e Marcela Mattos/Revista Veja
O estudante de rádio e tv Victor Deppman foi morto em frente a sua casa na Zona Leste de São Paulo
O estudante de rádio e tv Victor Deppman foi morto em frente a sua casa na Zona Leste de São Paulo(Reprodução/VEJA)
“Essa limitação da idade de 18 anos foi estabelecida no Código Penal de 1940. Nós vivíamos em um outro mundo, com outros estímulos. Não se pode dizer que um jovem de 18 anos daquela época é o mesmo do de hoje. O acesso à informação e à tecnologia favorece o desenvolvimento desse cérebro mais precocemente”, Kátia Mecler, psiquiatra forense da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)
No último dia 10, há pouco mais de uma semana, a maior cidade do país acordou assombrada com a morte do estudante Victor Hugo Deppman, de 19 anos. Na noite anterior, ele foi assassinado brutalmente quando voltava para sua casa, na Zona Leste de São Paulo, após sair da faculdade. O algoz: um rapaz que, três dias depois, completaria 18 anos. O delinquente que disparou contra o universitário já havia sido detido por roubo, mas não chegou a ficar preso por 45 dias, como é comum nesses casos. Livre, ele tirou a vida de Victor Hugo.
Como em outros casos envolvendo menores que agem à margem da lei, o crime provocou comoção. Foi assim também com as mortes do menino João Hélio Vieites, arrastado por sete quilômetros após um assalto no Rio de Janeiro, em 2007, e do casal Liana Friedenbach e Felipe Caffé, em 2003, em Embu Guaçu (SP). No centro das discussões está um tema conflituoso: a maioridade penal aos 18 anos.
O tema é conflituoso porque está cercado de mistificações e conceitos pseudocientíficos, alguns deles solidificados em dogmas que impedem que a discussão ocorra nos seus devidos termos: nem a psicologia, nem a neurologia, nem a sociologia, nem qualquer outro ramo do conhecimento dará uma resposta definitiva para que se estabeleça a idade em que as pessoas devem passar a responder plenamente pelos crimes que cometerem. Esse é um daqueles assuntos que precisam ser debatidos de maneira pragmática, de olho nos efeitos que cada solução pode trazer.
Na base da atual legislação está a ideia de que um adolescente não é capaz de controlar plenamente as suas reações. Isso é verdade. A regra que fixou a maioridade penal aos 18 anos é de 1940, mas as pesquisas mais recentes no campo da neurologia confirmam sua premissa. Segundo essas pesquisas, o córtex pré-frontal, a área responsável pelos “freios” no comportamento, começa a funcionar por volta dos quatro anos de idade, mas sua configuração não se completa antes da terceira década de vida. Levada a ferro e fogo, portanto, a ideia de que é preciso aguardar que uma pessoa esteja no pleno exercício da sua faculdade de autocontrole jogaria o limite normativo para algo em torno dos 25 anos – algo que nem o mais ferrenho defensor da maioridade penal estendida aventa hoje em dia.
Secretário do Departamento Científico de Neurologia Infantil da Associação Brasileira de Neurologia, José Luiz Dias Gherpelli afirma que não há um momento exato em que uma pessoa pode ser considerada plenamente responsável por seus atos. Ele diz que a discussão precisa considerar aspectos sociais e faz uma comparação: “No Xingu, ninguém tem dúvidas de que um rapaz de 14 anos já é um adulto”. Pelo critério da independência do indivíduo, ironiza Gherpelli, a discussão pode ir longe: “Então, talvez um jovem que tenha 22 anos, more com os pais e receba mesada não seja totalmente imputável pelos valores da sociedade atual”. Em outras palavras, qualquer limite nessa área terá algo de arbitrário: será uma convenção a ser negociada e transformada em lei.
A própria legislação brasileira tem marcos conflitantes. Um adolescente de 14 anos tem, por lei, o direito de manter relações sexuais com um adulto sem que isso seja considerado estupro presumido. O início da vida sexual implica profundas transformações psicológicas e afetivas para um jovem; a legislação, entretanto, considera que nesta idade os adolescentes já são capazes de fazer escolhas sozinhos. Aos 16, os jovens podem votar. Mais uma vez, o consenso foi o de que esses adolescentes aptos a decidir o futuro do país – e, portanto, conscientes de suas opções individuais.
A maioridade penal pelo mundoMuitos países tratam como criminosos comuns adolescentes que cometem delitos
  1. Estados Unidos (Oklahoma): 7 anosEm muitos estados, não há lei específica sobre idade mínima para a responsabilização penal. Até 2005, a pena de morte podia ser aplicada também aos menores de 18 anos. Mas a Suprema Corte derrubou a medida
  2. Irlanda: 10 anosVale para casos de crimes graves. Acima dos 12 anos, os adolescentes podem ser penalmente acusados por qualquer delito. Até 2006, o mínimo legal era de 7 anos
  3. Japão: 14 anosO Código Penal está em vigor há 113 anos. Mas o rigor com jovens infratores foi elevado depois de crimes bárbaros praticados por adolescentes
  4. Suécia: 15 anosA regra vale desde 1902. A partir desta idade, os adolescentes podem ser presos – embora o estado priorize medidas de reinserção social
  5. Argentina: 16 anosAté 1983, o limite era de 14 anos de idade. Recentemente, o Congresso tem discutido a volta da norma anterior
Nem sempre foi assim: a legislação brasileira já estabeleceu como critério a idade de 17 anos para o sexo consentido e a de 25 anos para o voto. Outro exemplo: até 2006, só aos 21 anos é que um jovem era considerado apto para abrir uma empresa, se casar ou viajar para o exterior sem a autorização dos pais. É a chamada maioridade civil. Os legisladores acharam razoável atualizar a norma, e rebaixaram esse limite para os 18 anos.
O que essa evolução mostra é que os limites etários estabelecidos pelo estado podem ser alterados porque não decorrem de valores imutáveis. Hoje, é comum que os menores infratores demonstrem total consciência diante de atos criminosos praticados. Aliás, este é um argumento usado em outros países que reduziram a maioridade penal: um adolescente que pega em uma arma para cometer um crime já não está demonstrando, na prática, ter capacidade de fazer escolhas autonomamente?
Hoje, quem comete um crime até a véspera do aniversário de 18 anos é encaminhado a uma Delegacia da Criança e do Adolescente. Pode ficar preso até 45 dias enquanto aguarda uma decisão do juiz. Depois disso, independentemente da gravidade do crime, o infrator ficará no máximo três anos detido – o que raramente ocorre. Periodicamente, os jovens internados nessas unidades passam por avaliação psicológica e, se aparentarem ter condições de retornar ao convívio social, podem ser liberados. Quando apresentam bom comportamento, eles também tem direito a visitar a família a cada quinze dias e são beneficiados pelos “saidões” em datas especiais.
A tese de que os adolescentes não podem ser punidos porque ainda não têm noção de limites é problemática: sem castigo, é impossível impor limites a quem opta pela delinquência desde cedo. Sem punição, a dor de familiares como os de Victor Hugo Deppman é ultrajada pela impunidade. Impunes, os adolescentes veem a porta do mundo do crime continuar aberta para eles.
A psiquiatra Maria da Conceição Krause, da Polícia Civil do Distrito Federal, trabalha com a avaliação de menores infratores há onze anos. Ela diz que, nesse período, o perfil dos jovens mudou: “Eles estão mais muito mais agressivos e não temem nada. Se os adolescentes já têm dificuldade em ter freios, isso tem aumentado. A impunidade faz aumentar”, diz. Ela defende o fim do tempo-limite para a internação; ou seja, que os menores sejam postos em liberdade apenas depois de darem sinais claros de que estão recuperados.
“Essa limitação da idade de 18 anos foi estabelecida em1940. Nós vivíamos em um outro mundo, com outros estímulos. Não se pode dizer que um jovem de 18 anos daquela época é o mesmo do de hoje. O acesso à informação e à tecnologia favorece o desenvolvimento desse cérebro mais precocemente”, afirma Kátia Mecler, psiquiatra forense da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Às autoridades policiais, resta a sensação de impotência: “É frustrante. Você quer que ele fique mais tempo, porque cometeu um ato grave. Ele não pode, em pouco tempo, ter outra oportunidade de cometer os mesmos atos infracionais”, diz a delegada Mônica Loureiro, chefe da Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) de Brasília. A delegada, que defende o aumento no tempo de internação dos menores delinquentes, diz que esses infratores têm plena consciência do mal que produzem. “Eles sabem tudo. E, como sabem desse pouco tempo que vão ficar apreendidos, quase todos confessam tudo abertamente, sem nenhum pudor”, diz Mônica. Ela estima que 80% dos jovens infratores que chegam à sua unidade são reincidentes. Nem todos são levados para unidades de internação.
O juiz Cristian Bataglia de Medeiros, diretor da Vara da Infância e Juventude na cidade de Novo Gama (GO), concorda: “Pelas audiências que a gente faz, esses menores infratores têm pleno conhecimento e capacidade de entender onde está o certo e o errado, o que é justo e o que não é; capacidade de discernimento eles têm”. Mas há, entretanto, quem resista a essa argumentação: “O jovem de 16 anos tem a mesma consciência que o de 18. Mas aos 16 ainda é propenso a ter mudança significativa, já que está em fase de mudança de personalidade”, afirma o promotor de Justiça da Infância e da Juventude Renato Varalda, que atua no Distrito Federal.
Reincidência - Enquanto há resistência da sociedade e do governo em implantar uma nova legislação para aumentar a punição aos jovens infratores, o sistema atual escancara a sua ineficácia. Desenvolvidos para serem um meio de recuperação, os centros de internação na maioria das vezes funcionam apenas para dar um intervalo à sequência de crimes praticados por um adolescente. Os dados mostram isso. Pesquisa divulgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2012 aponta que 43% dos adolescentes em cumprimento de medida de internação já haviam sido internados pelo menos uma vez. Na região Nordeste, por exemplo, a maioria dos infratores era reincidente: 54%.
Mais alarmante do que a constatação do retorno ao crime é o aumento da periculosidade. Enquanto na primeira internação são mais comuns crimes de roubo e furto, os jovens reincidentes mostram-se mais agressivos e, frequentemente, retornam por cometer crimes mais graves. A região Sul evidencia a situação: o crime de homicídio motiva a primeira apreensão dos jovens em 3% dos casos. Já na reincidência, a taxa sobe para 19%.
Mesmo classificando a internação como o melhor sistema de punição aos adolescentes, o promotor Renato Varalda reconhece que o sistema atual é falho. “As medidas não são adequadas. Faltam estrutura física e servidores. Além disso, deveria haver o acompanhamento de perto desses jovens que frequentam a escola”, enumera o promotor. Para Varalda, o principal problema não é a falta de regras, mas sim o descumprimento delas. “O que o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece ainda não está sendo aplicado na maioria dos lugares. Como a gente pode falar de redução da criminalidade e reeducação do menor se ainda não houve a aplicação das regras impostas, como os aspectos pedagógicos?”, questiona.
Legislativo - Depois da morte de Victor Hugo, mais uma vez, houve reação política contra um sistema que dá sinais evidentes de que já não funciona. As ideias apresentadas como solução, entretanto, variam. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), entregou pessoalmente aos presidentes da Câmara e do Senado uma proposta que, sem reduzir a maioridade penal, aumenta de três para oito anos o tempo máximo de internação dos menores infratores. “Apenas três anos de medida socioeducativa não estabelecem limites. A impunidade estimula a atividade delituosa”, explicou o governador. A proposta será defendida pela bancada tucana no Congresso e ganhou apoio dos presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Somente em São Paulo, cerca de 9.000 jovens cumprem medidas socioeducativas no momento. Desses, aproximadamente 1.700 já têm mais de 18 anos. Diferentemente de Alckmin, há parlamentares que defendem – e não é de hoje – a redução da maioridade penal para 16 anos. Por outro lado, o governo federal, o PT e entidades autoproclamadas defensoras dos direitos humanos resistem a mudanças; alegam que os adolescentes precisam ser tratados como pessoas em formação, que necessitam mais de acompanhamento psicológico e social do que de punição.
Nos últimos 30 anos, o Congresso viu serem apresentadas 67 propostas tratando da maioridade penal. Uma delas é da deputada Keiko Ota (PSB-SP). A parlamentar é mãe de Yves Ota, que tinha seis anos quando foi sequestrado e assassinado. O crime foi cometido por maiores de idade. Mas a deputada acredita que a redução da maioridade penal pra 16 anos é parte fundamental da luta contra a impunidade. “A gente realmente encontra muita resistência, principalmente das pessoas ligadas aos direitos humanos, que realmente não querem punir o menor infrator. Mas tem de haver uma punição. Não podemos jogar isso para a sociedade”, afirma a parlamentar.
Se decidir mudar a maioridade penal, o Brasil não estaria sendo vanguardista: em grande parte das nações democráticas, esse limite é inferior aos 18 anos. O deputado Roberto de Lucena (PV-SP) vai mais longe: tem uma proposta que extingue esse limite, deixando nas mãos do Judiciário a avaliação de cada caso. Agora, com a iniciativa de Alckmin, ele concordou em deixar seu projeto de lado para unir forças em torno de uma proposta com mais chances de aprovação: “Essa geração espera nada menos que pelo menos do que isso, que o Congresso cumpra o seu papel de lidar de maneira responsável com essa situação”, diz o deputado. Um dos filhos de Lucena era amigo de Victor Hugo Deppman.
Autor de um dos projetos que defende a redução da maioridade penal, o deputado Onofre Santo Agostini (PSD-SC) diz que, se as unidades de internação servem para educar, devem servir para punir: “O ser humano precisa ter medo de alguma coisa. O menor precisa saber que se cometer um crime será punido”, diz. Para ele, o risco da internação não é suficiente: “Abrigo de menor apenas serve para dar mais instrumentos para o crime.”
O deputado Domingos Dutra (PT-MA), que presidiu a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, é contra mudanças na legislação: “O que o Brasil precisa é de uma polícia bem remunerada, preparada e imune à corrupção; precisa de educação e de um aparelho judiciário mais eficaz”, diz ele.
O jurista Miguel Reale Júnior também critica a defesa da redução da maioridade como uma solução para os crimes envolvendo adolescentes: “O que é preciso mudar não é o modelo; parece que no Brasil se imagina, infantilmente, que mudar a lei muda a realidade. O problema é que não se faz política criminal”, critica. Reale defende, entretanto, um aumento no tempo máximo de internação.
Estrutura - Vencido o debate sobre a necessidade de mudanças na legislação, surge outro cenário de igual complexidade: a falta de estrutura dos sistemas prisional e de internação juvenil. Seja qual for a solução adotada – mesmo que a opção final seja pela manutenção do atual modelo -, será preciso resolver o abismo que existe entre o texto legal e a prática. Uma medida necessária é a construção de unidades de internação dignas e o aumento do efetivo dedicado ao acompanhamento dos adolescentes infratores.
O juiz Cristian Bataglia de Medeiros, que atua em uma região violenta no entorno do Distrito Federal, acredita que, diante das falhas do sistema prisional, a melhor medida seria extinguir o limite legal para o tempo de internação, o que permitiria manter longe das ruas os jovens mais problemáticos. “A redução da maioridade até seria interessante, só que não resolveria o problema. O fato de baixar de 18 para 16 vai fazer com que esses menores passem a ingressar no sistema carcerário, e o sistema não consegue atender nem a demanda que já existe”, afirma o juiz.
Bataglia afirma que, devido à falta de vagas no sistema de atendimento aos menores infratores, muitos deles não chegam a ser detidos – ou ficam pouco tempo. “Geralmente, até por uma questão de dificuldades de vaga, eles não ficam três anos. Quando muito, ficam seis meses, até um ano, e são liberados.”
Nesse debate, o governo se mantém omisso. Além de barrar as tentativas de redução da maioridade penal, o Executivo não apresenta alternativa para melhorar um modelo que cria delinquentes juvenis em série. A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, se recusou a responder quando perguntada pelo site de VEJA sobre o assunto.

Conheça os segredos para chegar bem aos 60 anos de idade


“Cuidar da saúde, da mente e dos relacionamentos é tão importante quanto cuidar do dinheiro na busca por uma aposentadoria feliz”. Quem faz a afirmação é Jurandir Macedo Sell, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e consultor de finanças pessoais do Itaú Unibanco.
Em entrevista concedida ao Portal Previdência Total, o professor revela que existem quatro fatores determinantes para se chegar bem aos 60 anos. “É fundamental cuidar de quatro capitais: o capital físico, que é o cuidado com o corpo e com a saúde, essenciais na garantia da longevidade saudável; o capital social, que nada mais é que a capacidade de criar e manter bons relacionamentos com família e amigos; o capital intelectual, representado pela capacidade de relacionamento com as mudanças do mundo ao nosso redor – sociais, nas regras de convívio e comportamentos das novas gerações e até tecnológicas, com a internet e toda a mobilidade possibilitada por celulares e outros aparelhos, incluindo os caixas eletrônicos dos bancos. E o capital financeiro, que é a capacidade de a pessoa viver bem com o que tem.”
Na entrevista, o professor avaliou, ainda, a importância de contratar um plano de previdência privada para complementar a aposentadoria, “sem jamais deixar de contribuir com a Previdência Social”, e aborda a importância da educação financeira, desde os primeiros anos de vida.
Confira a íntegra da entrevista:
Previdência Total – A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2012 revelou que 22% dos aposentados no país têm entre 40 e 49 anos de idade. Como o senhor avalia esse cenário?
Jurandir Macedo Sell - A situação é bem preocupante, na medida em que se percebe um aumento considerável de aposentadorias precoces. Esse grande número de jovens aposentados, que passam de contribuintes a beneficiários da Previdência Social, traz um cenário tenso para os cofres públicos.
Um sério agravante para a Previdência é o crescimento da expectativa de vida no país. Hoje, ela é de 71,3 anos para homens e de 78,5 para mulheres. Em 2041, deve alcançar 80 anos, para ambos os sexos. A projeção mostra que, com a continuidade das aposentadorias precoces, teremos pessoas se aposentando cada vez mais cedo e gozando do benefício da aposentadoria por período cada vez maior.
O fator previdenciário foi uma das alternativas criadas para equilibrar essas aposentadorias precoces. O senhor vislumbra outras alternativas na busca desse equilíbrio?
É preciso se pensar em alternativas ao sistema previdenciário. Uma opção poderia ser a criação de um mecanismo pelo qual o trabalhador se aposentasse aos poucos, mais vagarosamente, sem haver uma ruptura entre o “momento trabalho” e o “momento aposentadoria”. Por que não criar um processo em que, com o avançar da idade e do tempo de serviço, o trabalhador reduza lenta e progressivamente sua jornada de trabalho e seu salário, até culminar, então, na aposentadoria?
As pessoas poderiam, assim, se adaptar aos poucos à aposentadoria enquanto contribuem com seu conhecimento adquirido. Não raramente, acompanhamos na imprensa casos em que a pessoa se aposenta e, pouco tempo depoi,s sai em busca de reinserção no mercado de trabalho, por ainda se achar jovem para parar de trabalhar.
O aumento da expectativa de vida exige do trabalhador mudanças de comportamento, no que diz respeito ao planejamento da aposentadoria?
Com certeza. Não há mágica. Se viveremos mais, teremos de nos preocupar mais com o planejamento da aposentadoria. No decorrer dos anos, houve uma mudança na estrutura da família e na forma de se pensar a aposentadoria.
Antigamente, a expectativa de vida era mais baixa, poucas eram as pessoas que alcançavam idades avançadas. O costume era de guardar certo capital e, em caso de eventualidade, contar com o socorro da família. Os jovens tinham na possível herança, o seu porto seguro.
Agora, com o envelhecimento de mais integrantes da família, a demanda gerada é maior. O perfil atual da família exige um grande e importantíssimo equilíbrio financeiro. Quem pensa em cuidar do futuro do filho, precisa antes se preocupar com o seu próprio futuro. E o foco do jovem de hoje também deve mudar. Ele precisa pensar em seu futuro desde cedo, desde os primeiros anos de vida profissional.
Como o senhor avalia o comportamento/ planejamento atual do brasileiro rumo à aposentadoria?
O brasileiro se preocupa tardiamente com o planejamento da aposentadoria. O número de brasileiros que contribui com a Previdência Social ainda é muito baixo e, no que diz respeito à previdência privada, muita gente acha que, tendo menos de 50 anos, é muito cedo para se pensar nesse tipo de investimento. Só que, ao chegar aos 40 anos, ele passa a refletir melhor, se arrepende do tempo não contribuído e vê que já passou da hora de planejar a aposentadoria.
Em geral, a visão que o brasileiro ainda tem é a de que o governo tem a obrigação de garantir o nosso futuro, mesmo sabendo que isso dificilmente acontecerá. Quem dita o dia de amanhã devemos ser nós. E, para isso acontecer de maneira saudável, o planejamento é essencial. Quanto mais cedo ele começar, menos oneroso e mais simples será alcançar uma aposentadoria tranquila.
Qual é a importância de se fazer um plano de previdência privada em conjunto com a Previdência Social e desde quando o brasileiro deve pensar nisso?
A resposta está no interesse de cada trabalhador. O teto máximo do INSS hoje é de R$ 4.159,00. Poucos, porém, conseguem alcançar esse valor. De acordo com o Ministério da Previdência, dos 17 milhões de aposentados, somente 220 mil recebem essa faixa de benefício. Grande parte dos contribuintes tira, em média, R$ 2 mil/mês. A pergunta que todos devem se fazer é se esse valor é o ideal. A resposta definirá a importância de se fazer um plano de previdência privada para complementar a renda.
É importante, porém, fazer duas ressalvas. A primeira é que o INSS deve ser pago sempre, desde o primeiro dia de trabalho, antes de qualquer plano privado. Não se deve abrir mão dessa contribuição e do futuro benefício.
A segunda ressalva é o cuidado que se deve tomar na escolha do plano de previdência privada. A pessoa que realiza esse tipo de investimento está, na verdade, nomeando um gestor que vai cuidar de seu dinheiro. É preciso acompanhar onde a instituição escolhida aplica os recursos; monitorar o rendimento. O cliente deve saber que não basta pagar mensalmente. Tem que tomar ciência daquilo que está sendo feito com o dinheiro. Essa vigilância faz enorme diferença lá na frente, no momento de retirar o rendimento. O pensamento a ser seguido é: “ou você ou o seu dinheiro vão ter que trabalhar enquanto você existir”.
O senhor acha que falta nas escolas e universidades uma disciplina de educação financeira?
As mudanças constantes na economia também deram dinamismo ao processo de educação financeira. Hoje, uma criança de seis ou sete anos já tem noções sobre dinheiro. Pais costumam dar semanadas ou mesadas para seus filhos e os eles aprendem que, para comprar algo que se queira, é preciso administrar os ganhos. Isso é educação financeira.
E a responsabilidade de ensiná-la não cabe somente às escolas e universidades. Deve começar cedo, em casa, e ser aprofundada, acompanhando o desenvolvimento da pessoa. Esse aprofundamento deve seguir vindo do lar, em conjunto com as escolas, universidades e governo.
Existe algum segredo para a aposentadoria tranquila? Qual o momento ideal para se aposentar?
Em um trabalho que desenvolvi com dois executivos do Itaú Unibanco, Martin Iglesias e Denise Hills, traçamos os fatores determinantes para se chegar bem aos 60 anos.
Mostramos que é fundamental cuidar de quatro capitais: o capital físico, que é o cuidado com o corpo e com a saúde, essenciais na garantia da longevidade saudável; o capital social, que nada mais é que a capacidade de criar e manter bons relacionamentos com família e amigos; o capital intelectual, representado pela capacidade de relacionamento com as mudanças do mundo ao nosso redor – sociais, nas regras de convívio e comportamentos das novas gerações e até tecnológicas, com a internet e toda a mobilidade possibilitada por celulares e outros aparelhos, incluindo os caixas eletrônicos dos bancos. E o capital financeiro, que é a capacidade de a pessoa viver bem com o que tem.
A boa velhice é alcançada quando se consegue o equilíbrio desses capitais. Para alcançá-los, há que se considerar três importantes influências: o que já recebemos pronto de nossos pais, a sorte ou acaso, também chamado de destino para quem acredita, e a forma como nos comportamos perante as outras duas influências. É o modo como enfrentamos os desafios e oportunidades que a vida nos apresenta e que vai nos dirigir ao que somos e no que seremos (ou não) na velhice.
Agora, tão importante quanto alcançar tais capitais para se chegar bem aos 60 anos é mantê-los constantemente.

Mais uma vez o Governo coloca a Previdência Social como o “bode expiatório” do desequilíbrio nas contas públicas

  • Previdência responde pela maior parte do déficit do Governo Central. A informação foi divulgada pelo Tesouro Nacional

Desaposentação: Supremo Tribunal Federal(STF) precisa resolver se vai contra ou a favor dos aposentados

Desaposentação – STF tem que decidir se vai contra ou a favor da população
Por Guilherme de Carvalho*
A decisão final sobre a desaposentação– renúncia da uma aposentadoria na busca de outra mais vantajosa – que está sendo julgada no Supremo Tribunal Federal (STF), diz muito sobre os rumos que o país poderá tomar nos próximos anos, pois, uma decisão contrária vai totalmente contra o interesse da população, mostrando assim que a nossa Justiça dá mais importância as questões políticas e financeiras acima do direito e a vontade popular.
O debate ainda está indefinido, com dois votos favoráveis à questão e dois contrários. Na sessão do dia 9 de outubro deste ano, o ministro Luís Roberto Barroso (relator dos REs 661256 – com repercussão geral – e RE 827833) considerou válida a desaposentação, argumentando, de forma correta, ser nossa legislação omissa em relação ao tema, já que não existe nenhuma proibição expressa aos aposentados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que continuem trabalhando. No dia anterior a esse voto, o Ministro Marco Aurélio de Mello, também já tinha se declarado favorável.
Contudo, no dia 27 de outubro, os ministros Dias Toffoli e Teori Zavascki, demonstrando posições que seguem interesses do governo e votaram contrários a tese, ambos entendem que a legislação não assegura esse direito. Na sequência a ministra Rosa Weber suspendeu o julgamento com mais um pedido de vista dos autos. Ainda não há data para continuidade da votação.
Enfim, há forte pressão do Governo Federal contra a tese, seus porta-vozes diversas vezes informaram não aceitar a desaposentação, apontando motivos variados. Mas, é certo, tal posição tem um único motivo, o financeiro. Já é praticamente um consenso que esse é um direito dos contribuintes que se aposentam e continuam a trabalhar e a contribuir com o INSS, tanto que as decisões judiciais favoráveis se multiplicam. Entretanto, é explicável a posição contrária do Governo a esse direito, são mais de 500 mil brasileiros que possuem esse direito, o que poderia causar uma grande defasagem financeira na previdência, já que não foram feitas previsões para estes valores.
Contudo, não é porque o modelo previdenciário brasileiro cometeu erros que os aposentados e pensionistas devem pagar. Esses contribuíram com valores maiores por um período de tempo e tem direito a um maior rendimento. Outro ponto relevante é que na maioria das decisões os aposentados não estão sendo obrigados a devolverem o que já receberam da aposentadoria, o que desfaz mais um argumento do Governo.
Observo diariamente um crescente número de ações judiciais pedindo a desaposentação, pois a população anseia por esse direito, as decisões favoráveis nos demais tribunais estão crescendo, vemos que finalmente os aposentados passaram a acreditar que realmente possuem este direito.
Assim, uma decisão contrária do STF, seria um verdadeiro balde de água fria no ânimo desses aposentados, uma verdadeira injustiça. O que só comprova que a decisão só mostrará na realidade de que lado nossa justiça está, se da população ou do capital.

ATENÇÃO: Justiça autoriza INSS a cobrar dos aposentados valores pagos por meio de liminares

Justiça Federal entende que restituição tem que ser feita se decisão inicial for reformada

Rombo no fundo de previdência dos Correios ameaça aposentadoria dos carteiros

Funcionários dos Correios apertam os cintos para cobrir deficit da estatal, o fundo que complementa a aposentadoria dos empregados. Gestores aplicaram em ações de bancos falidos e até em títulos da Venezuela. Senadores pedem CPI

 
Rodolfo Costa/CB/D.A Press
“Minha mulher está desempregada e, nessas condições, não teremos dinheiro nem para pagar a água e a luz. Vou tentar algum bico para tirar um extra no fim do mês%u201D Gildásio José Alves da Silva

O carteiro Gildásio José Alves da Silva, 55 anos, teme que não conseguirá mais ter recursos suficientes para cobrir as despesas do mês. Não bastasse o ambiente de economia recessiva, com inflação e juros altos, ele será um dos 71.154 trabalhadores ativos dos Correios que precisarão tirar dinheiro do bolso para cobrir um deficit atuarial de R$ 5,6 bilhões no fundo de pensão dos empregados da estatal, o Instituto de Seguridade Social dos Correios e Telégrafos (Postalis). Do salário de R$ 2,5 mil de Gildásio, 59% estão comprometidos com dívidas. “Não vai sobrar nada para consumo”, lamentou.
Preocupado, o carteiro pensou em pedir à filha que suspendesse o curso de pedagogia, cuja mensalidade é de R$ 600 por mês. “Voltei atrás porque quero um futuro melhor para ela. Mas terei que reduzir outras despesas”, explicou, prevendo eliminar gastos com telefonia fixa e internet. Além disso, Gildásio pretende procurar um emprego informal para complementar a renda. “Minha mulher está desempregada e, nessas condições, não teremos dinheiro nem para pagar a água e a luz. Vou tentar algum bico para tirar um extra no fim do mês”, disse ele, que se desdobra para colocar comida à mesa com o vale-alimentação de R$ 900.
Do rendimento mensal, depois de pagas as contas indispensáveis, sobravam R$ 220 para gastar com compras menos importantes e com lazer. Mas, para cobrir o rombo do fundo de previdência — e evitar o drama de ficar sem assistência suficiente na aposentadoria —, ele sofrerá um desconto de R$ 215 no contracheque, a partir deste mês. O montante vai ser usado para cobrir o rombo do plano BD Saldado, um dos dois oferecidos pelo Postalis. Criado em 1981, o plano foi fechado à entrada de novos participantes em 2005, e saldado compulsoriamente três anos depois. Os mais de 71 mil trabalhadores participantes terão de pagar até 24,28% sobre o valor dos benefícios que já recebem, ou que teriam direito de receber se já estivessem aposentados. O outro plano, o PostalPrev, instituído em 2008, não teve alteração nos valores de contribuição.